O Senado aprovou nesta quarta-feira (13) o texto-base do projeto que regulamenta o pagamento de emendas parlamentares. Foram 46 votos favoráveis, 18 contrários e uma abstenção. Por acordo, os senadores decidiram adiar a votação dos destaques [pedidos de mudança] apresentados à proposta do relator, senador Angelo Coronel (PSB-BA), que é um substitutivo ao texto aprovado pela Câmara dos Deputados na semana passada ( PLP 175/2024 ). O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, suspendeu a sessão e informou que a nova data para concluir a votação deverá ser decidida em reunião de líderes agendada para esta quinta-feira (14).
Durante a sessão plenária, o relator leu o seu parecer que retoma a possibilidade de bloqueio dos recursos das emendas por parte do Executivo em caso da necessidade de ajuste das contas públicas. Mas um destaque sobre a retirada dessa possibilidade ainda pode ser aprovado na próxima sessão.
Pacheco afirmou que o adiamento será importante para que se chegue a um acordo em relação aos destaques. A preocupação do presidente do Senado é que as mudanças não impactem o texto acordado entre Senado, Câmara, Executivo federal e Supremo Tribunal Federal (STF)
— Esse tempo [é importante] para o diálogo entre governo, oposição e líderes partidários para que possa manter higidez do projeto. Alguns destaques, na verdade, estabelecem premissas que são divergentes entre o que foi acordado — avaliou Pacheco.
O texto, proposto pelo deputado Rubens Pereira Júnior (PT-MA), é uma tentativa de resolver o impasse sobre o pagamento das emendas individuais impositivas, das quais fazem parte as chamadas "emendas Pix" ou de transferência especial, que somam R$ 8 bilhões em 2024. A liberação de todas as emendas está suspensa por determinação do ministro do STF, Flávio Dino, que exige regras sobre rastreabilidade, transparência, controle social e impedimento. Os senadores têm pressa para votar a proposta em razão de obras paradas em municípios que estão sem receber os repasses há cerca de quatro meses.
O tema que gerou maior polêmica durante a sessão foi a inclusão no substitutivo do termo bloqueio, que estava previsto no projeto original. Na Câmara, ele foi trocado por contingenciamento, permitindo o corte nas verbas parlamentares diante de uma queda nas receitas, mas não diante da elevação de despesas. A nova redação dada por Coronel, que também relata o projeto do Orçamento para 2025 ( PLN 26/2024 ), autoriza tanto o contingenciamento quanto o bloqueio de emendas, o que deve ocorrer na mesma proporção de outras despesas não obrigatórias do governo.
— O governo terá a opção de bloquear as emendas impositivas se a receita cair e não tiver recurso para despesas obrigatórias — defendeu Coronel.
Mas, a preocupação de parlamentares é que o bloqueio leve ao cancelamento das emendas em caso de não cumprimento da meta fiscal do governo. Líder da oposição, o senador Rogerio Marinho (PL-RN) destacou que, embora o contingenciamento de recursos seja constitucional e legítimo, a proposta atual vai além, permitindo o bloqueio de recursos sem qualquer tipo de controle.
— Estamos colocando em risco a independência do Parlamento — alertou Marinho.
O senador também mencionou que, mesmo com o limite de bloqueio de até 15% de recursos das emendas que vem sendo negociado pela área econômica, ainda não houve uma discussão real sobre uma contrapartida que demonstre a responsabilidade fiscal do governo. Ele afirmou ainda que o bloqueio pode levar a uma relação “promíscua” entre os parlamentares e o governo.
— O contingenciamento é constitucional, lícito e justo. Porém, a proposta é de permitir não o contingenciamento, mas o bloqueio dos recursos parlamentares, aliás, sem nenhum sarrafo. Fui informado da possibilidade de que esse sarrafo seja estabelecido em até 15%. São recursos discricionários, impositivos e constitucionais, que impedem que haja uma relação promíscua entre o governo e o Parlamento — criticou Marinho.
Em busca de consenso, o senador Randolfe Rodrigues (PT-AP) sugeriu retirar o termo bloqueio do texto. No lugar, ele sugeriu emenda para adequar as emendas parlamentares a dispositivo da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) que prevê a limitação de empenho em caso de arrecadação insuficiente.
Pela regra em vigor, o dinheiro das "emendas Pix" chega à conta da prefeitura ou do estado sem formalização de convênio, ou seja, sem vinculação a qualquer tipo de gasto relacionado a projetos. Mas pelo PLP 175/2024, o autor da emenda precisará informar o objeto e o valor da transferência ao ente beneficiado (estado, Distrito Federal ou município).
A destinação preferencial é para obras inacabadas propostas anteriormente pelo próprio parlamentar. Também terão prioridade as transferências para entes federativos em situação de calamidade pública. Coronel destacou que a proposta é resultado de negociações entre os Poderes.
— Estamos imbuídos de resolver um impasse que vem se arrastando deixando prefeitos do Brasil afora [sem previsão] quanto ao término de obras abandonadas por falta de recursos, por essas emendas não estarem sendo liberadas — defendeu o relator.
O senador Carlos Portinho (PL-RJ) afirmou que a suspensão das emendas pelo STF é uma invasão das competências de deputados e senadores.
— O Congresso está permitindo essa afronta e prejudicando o cidadão na ponta, que precisa do serviço de saúde, e eu estou falando de emendas impositivas, que estão na Constituição. Não cabe ao STF suspendê-las — disse.
Durante o debate, o senador Randolfe afirmou que a decisão do STF foi em resposta a ações do Psol e do Novo, ambos os partidos contam com representação no Congresso.
— Tem um mandamento constitucional que nós, a partir da provocação ao Supremo Tribunal Federal por dois partidos com assento nesta Casa, temos que buscar adequar. É esse o trabalho feito aqui pelo Senador Angelo Coronel.
O projeto original previa de quatro a oito emendas de bancada, segundo o tamanho da população de cada estado. Mas os deputados alteraram a proposta para fixar em oito emendas para cada bancada estadual. O texto alternativo do relator ampliou o número para 10. Essas emendas são impositivas, ou seja, de execução obrigatória.
— A Câmara aprovou 8 emendas de bancada. Colocamos dez emendas para todos os estados atendendo emendas de vários senadores. [...] Atualmente, nós podemos fazer, nas bancadas, de 15 a 20 emendas. Com isso, fizemos uma média e atendemos as reivindicações dos parlamentares e, acredito também, a expectativa do governo federal — disse Coronel.
As emendas de bancada estadual somente poderão destinar recursos a projetos e ações estruturantes para a unidade da federação representada pela bancada.Outra possibilidade de aplicação desse tipo de emenda será em ações e equipamentos públicos prioritários para a bancada estadual. Mas, nesse caso, os recursos não podem atender a demandas ou indicações isoladas de cada parlamentar.
O texto também proíbe a apresentação de emenda cuja programação possa resultar, na execução, em transferências voluntárias ou convênios para mais de um ente federativo. A exceção é para os fundos municipais de saúde.
Além dessas 10, podem ser apresentadas até três emendas por bancada para dar seguimento a obras já iniciadas.
O projeto admite a possibilidade de divisão do valor da emenda. Mas, nesse caso, cada parte independente não pode ser inferior a 10% do valor total da emenda, exceto para ações e serviços públicos de saúde. O texto considera parte independente:
O relator retirou a restrição que impedia os parlamentares de destinar recursos de transferências especiais para obras inacabadasque não fossem de sua autoria. Segundo ele, trata-se de “uma limitação prejudicial à continuidade dessas obras”.
Coronel também restaurou a previsão do texto original da Câmara, que permite aos órgãos de fiscalização indicar ajustes no plano de trabalho das emendas de transferência especial, caso identifiquem inconsistências.
Quanto à fiscalização, o texto prevê que os recursos repassados por meio de emendas Pix ficam “sujeitos à apreciação do Tribunal de Contas da União (TCU)”. O ente beneficiado com a “emenda pix” deve indicar no portal sobre transferências e parcerias da União (Transferegov) a agência bancária e a conta corrente específica para depósito. Além disso, precisa comunicar ao TCU, ao respectivo Legislativo e aos tribunais de contas estaduais ou municipais, em 30 dias, o valor recebido, o plano de trabalho do objeto e o cronograma de execução.
No caso das emendas de comissão, os recursos serão alocados em ações de interesse nacional ou regional, com a exigência de que o objeto da emenda seja claramente identificado. Pelo menos 50% dos recursos das emendas de comissão deverão ser direcionados à saúde, conforme critérios técnicos definidos pelo gestor federal do Sistema Único de Saúde (SUS). Caberá aos líderes consolidar as indicações das bancadas e encaminhar às comissões para deliberação. Esse ponto é outro alvo de divergência entre os senadores.
— Na verdade, o que nós estamos fazendo aqui hoje, nesta noite — espero que não, tenho esperança que não —, é legalizando o orçamento secreto, das emendas de comissão com listas enviadas pelos líderes, sem identificação real dos autores das indicações — criticou Eduardo Girão (Novo-CE).
Para o exercício de 2025, o limite para emendas parlamentares considerará o teto previsto na Constituição para as emendas impositivas, acrescido de R$ 11,5 bilhões para as emendas não impositivas. O limite para as emendas individuais e de bancadas estaduais deve seguir as regras do regime fiscal sustentável, previstas na Lei Complementar 200, de 2023 , do Novo Arcabouço Fiscal.
No caso das emendas de comissão, que não são impositivas, o cálculo é diferente. O limite tem como base o valor global do ano anterior, mais o IPCA dos últimos 12 meses encerrados em junho do ano anterior àquele a que se refere o Orçamento votado.
O texto prevê que para o orçamento de 2025, em particular, os órgãos executores de políticas públicas deverão publicar critérios e orientações de execução das programações de interesse nacional ou regional, que deverão ser observados em todas as programações discricionárias do Executivo.
Todas as emendas parlamentares ficam sujeitas a hipóteses de impedimento técnico. Essas hipóteses são definidas pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) a cada ano e pelo próprio PLP 175/2024, que prevê uma lista de casos de restrição.
De acordo com a proposição, é proibido impor hipóteses de impedimento a emendas parlamentares que não sejam igualmente aplicáveis às programações do Poder Executivo.